Taking Woodstock, de Ang Lee
EUA, 2009
Mostra Panorama do Cinema Mundial
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A versatilidade do diretor taiwanês Ang Lee é um atributo que chama atenção em sua filmografia. Passando por diferentes gêneros e histórias das mais variadas, a narração da vez volta-se para um dos festivais de música mais marcantes da história, o Festival de Woodstock – que não aconteceu Woodstock, mas na pequena White Lake. Graças ao jovem Elliot Tiber [Demetri Martin em um personagem irresistível], mesmo controverso à comunidade local, os extensos gramados da cidade, e o quintal de sua casa, tornaram-se o abrigo de milhares de hippies que traziam consigo ideologias, sexo, cores e drogas. Em Aconteceu em Woodstock, esse cenário que evoca o natural e a liberdade – o lado oposto do que a mesma geração viu na Guerra do Vietnã – ganha um registro vivo enquanto acompanhamos a relação de Elliot com as transformações locais e, principalmente, as suas próprias.
Tudo ocorre gradativamente, no ritmo comum aos filmes do diretor. O pacato lugar e o gramado ainda florido e vazio são vistos inicialmente ao som de trilha sonora econômica de Danny Elfman, a qual também evolui para o rock a medida que todo aquele ambiente é preenchido. Acompanhar esse processo é a chance de presenciarmos, mesmo distante e décadas passadas, uma dose daquele acontecimento de forma muito próxima, não exatamente ao Festival, mas do que e quem o fez acontecer, já que o roteiro e a direção não nos permitem sair da perspectiva de Elliot. O que torna essa experiência tão agradável é o clima da narração, a sensação de um espírito pulsante e livre daquela geração – ainda que desconhecido para quem não a vivenciou -, de pessoas que parecem felizes demais, despreocupadas demais a qualquer coisa que não seja daquela realidade – como a última cena ressalta. Como o policial que ingeriu fumaça em excesso e por isso não agia segundo seu ofício, o espectador pode facilmente se levar pela atmosfera que o longa reside. A mesma que parecia presente naquele lugar.
Não é somente um trabalho de direção de arte e figurino, o qual, sem subestimá-lo, é eficiente em recriar época e estilos e oferecer um visual atraente. Mas é um fruto, sobretudo, da direção de Ang Lee, e só por ser capaz de materializar esse clima, merece méritos. Aliás, é um diretor de certa forma até discreto com o uso de sua câmera; porém, transmite muito dos personagens – seja ao se aproximar deles ou ao revelar sua óptica – e alcança diretamente o público ao valorizar uma direção a favor do que há na tela. Como dois longos planos-sequências os quais, ao mesmo tempo que não perdem o foco em Elliot, não evitam em revelar os acontecimentos ao seu redor, o estado que o Festival deixou a cidade e seus moradores. Ou ainda a beleza e inocência como o pai do protagonista observa o banho nu dos hippies, na cena que talvez melhor exemplifique a sensibilidade de Ang Lee sobre sua narração.
Ainda há um aspecto documental que valoriza o longa como um registro de um evento real e pretérito, e em diversas passagens, é como se o espectador estivesse situado no meio daquela multidão. O split screen [recurso que consiste na divisão da tela] é mais uma vez empregado por Lee – como fizera em seu Hulk -, mas desta vez nos aproximando ainda mais da visão do protagonista. Revelando a mesma cena em diversos ângulos, o recurso, sempre curioso, funciona como um bom exercício especialmente em alguns momentos, como na cena da encenação de uma peça, quando o espectador nota antes de alguns personagens o que irá se suceder e o efeito cômico é facilmente alcançado.
Com um leque de personagens e um elenco que oferece grandes trabalhos [os maiores destaques, além de Martin, fica por conta de Imelda Stauton e Liev Schreiber], Aconteceu em Woodstock encontra sua fraqueza ao se encaminhar para o fim, quando perde o ótimo ritmo ao alongar em excesso algumas sequências já com tempo de projeção avançado. Incomoda, porém, a agradável experiência presente até então jamais se perde por completo. Quando os créditos finais surgem, é preciso voltar ao mundo real. Fica uma boa lembrança, como deve ter sido, ainda mais, os três dias de Festival para aquelas milhares de pessoas.
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Eu achei esse negócio da câmera ficar distante do palco muito bacana. Acho que é um filme tecnicamente correto. Ang Lee já domina como os grandes a arte cinematográfica,mas paga um preço por isso: é tudo certo demais. Ainda assim, como o roteiro e o argumento são muito bons, o filme agrada bastante.
Abs!
Belo texto, Jeff! Adoro o cinema do Ang Lee e por isso estou bem interessado em “Aconteceu em Woodstock”, sem falar na própria história que chama a atenção.
Eu não sou grande fã do diretor mas esse tipo de comentário tá me deixando até empolgado pra conferir.
Parece ser ótimo Jeff! Pelo visto começamos bem o Festival :)
Eba! Cobertura do Festival!
Adorei a impressão. Acho que vou curtir este filme, sim. Até porque acho Lee um espectacular cineasta. Espero que estreie logo.
Não adoro todos os filmes do Ang Lee que vi, mas por motivos outros que não a direção, tudo que você disse sobre a direção, mesmo quando não estava elogiando, só me deram mais vontade de ver o filme. A câmera do Ang Lee pode ser considerada correta demais pra alguns, mas pra mim isso não é demérito nenhum, aliado aos demais fatores visuais dos seus filmes, a direção dele sempre me enche os olhos. Mais ansioso ainda pra ver o filme agora, que chegue logo aqui!
Simplesmente imperdível!!!!!!!